A indústria da construção civil se ressentiu-se recentemente de “apagão” de mão de obra qualificada. Tratava-se de um falso problema – o que realmente fazia e faz falta no Brasil é a oferta de “mentes de obra”
As manchetes de jornal noticiaram à sociedade brasileira a existência de um verdadeiro “apagão” de mão de obra em todos os setores da atividade econômica – e, em especial, na construção civil. Em inúmeras matérias, falava-se da baixa qualificação dos trabalhadores. Erroneamente surgem artigos na mídia que apontam a abaixa qualidade da mão de obra como a responsável pela má qualidade das edificações e, principalmente, pelo elevado desperdício de recursos e materiais que fazem a fama do setor. Escreve-se também sobre a insuficiência de engenheiros para tocar as obras de infraestrutura necessárias à sustentação do crescimento e, ainda, para suprir as demandas habitacionais não satisfeitas no Brasil.
Em um passado não muito remoto, as atividades econômicas eram dependentes da grande oferta de mão de obra. O estágio de desenvolvimento tecnológico do país assim o exigia. O termo “mão de obra” ainda é usado de forma genérica para designar todo e qualquer recurso humano necessário à realização de uma tarefa. Mas aqui cabe uma questão: será a “mão de obra” o recurso mais escasso? Vejamos: o mundo inteiro concorda – o Brasil inclusive – que estamos na era do conhecimento. Qualquer ganho de produtividade nas atividades econômicas decorre da aplicação de inúmeros fatores ligados ao conhecimento: Criar, inovar, gerir, liderar, conhecer, treinar, motivar… Os verbos mais usados em dez entre dez manuais de gestão têm relação com o conhecimento, e não com as mãos. Logo, quando falávamos da escassez de mão de obra, talvez o termo correlacionado devesse ser falta de “mente de obra”, em substituição a “mão de obra”.
É exatamente o que ocorre na construção civil, por exemplo. Vários estudos revelam que os ganhos de produtividade passam por melhorias de projeto e seus detalhamentos, evolução do gerenciamento, mudanças que proporcionem uma maior participação de componentes industrializados e incremento da logística de suprimentos, entre outros avanços. Todos esses fatores têm alto impacto na velocidade, no custo e na produtividade da construção civil – e todos dependem mais de um melhor desempenho de gerentes e engenheiros do que da qualificação da “mão de obra”, no sentido clássico do termo.
Alguns dados sobre o estágio de desenvolvimento tecnológico e gerencial da construção civil no Brasil são curiosos. Eles mostram que há um grande gap tecnológico e gerencial que deve ser vencido para que a cadeia produtiva do setor tenha ganhos de eficiência.
Para entender melhor que “gap” é esse, é preciso distinguir os conceitos de “conversão” e “fluxo”. Conversão são todas as tarefas que convertem energia ou recursos em valor agregado. Já tarefas de fluxo são aquelas relacionadas ao transporte interno de materiais, armazenagem e tempos de espera – seja por falta de materiais, indefinições de projeto, gargalos logísticos internos e outros problemas dentro do canteiro de obras que convertem energia em custo, e não em valor agregado.
Estudo recente conduzido pela Ernst & Young junto à executivos ligados ao setor da construção civil indicou que as alavancas para melhorar a produtividade do setor são, principalmente a melhoria do planejamento, dos projetos, dos métodos de gestão e a qualificação da mão de obra.
Ocorre que se os três primeiros foram implementados, o quarto torna-se menos necessário uma vez que os primeiros tendem a reduzir a necessidade de mão de obra, através do aumento de sua produtividade em decorrência de fatores alheios à qualidade da mão de obra em si mas decorrentes da melhor alocação e aproveitamento da mão da própria mão de obra.
Os fatores mais impactantes, portanto, para o aumento da produtividade na construção civil não dependem de treinamento de mão de obra, mas de “neurônios de obra”, que tornarão a mão de obra menos necessária.
É esse o futuro inexorável que nos aguarda.